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Acordos da COP27 para a transição energética

A 27ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP27, sediada na cidade Sharm El Sheikh, no Egito, foi marcada por repressões à ativistas e impasses relativos aos acordos firmados na edição anterior do encontro, principalmente em relação à transição energética – ponto crítico do aquecimento global. Em um texto preliminar publicado antes do encerramento da conferência, os líderes dos países membros da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), em consenso, reafirmaram o compromisso com as metas estabelecidas no Acordo de Paris para conter o aumento da temperatura global em até 1,5 °C. Contudo, as estratégias a serem adotadas para mitigar o aquecimento global, não foram especificadas.

 

No setor energético, a redução e eliminação do uso de combustíveis fósseis é uma das medidas mais substanciais para atingir as metas dos acordos e conter o aumento da temperatura do planeta. Mas o único compromisso assumido nesse sentido se resumiu à restrição de subsídios para conter a queima de carvão mineral, sem inclusão de medidas para o uso de outros combustíveis fósseis não renováveis e igualmente ineficientes como os derivados de petróleo e gás natural, fontes de energia amplamente utilizadas por indústrias e residências.

 

Apesar da crise energética na Europa instituída pelo conflito entre Rússia e Ucrânia, indicando a urgente necessidade de transformação e diversificação de tecnologias no quadro mundial, não houve avanços e acordos significativos para a agenda. Desfavorável também para a economia dos países, considerando que segurança energética é uma questão estratégica, uma vez que sua escassez pode acarretar aumento dos custos, queda do crescimento econômico e, consequentemente, da competitividade industrial.

 

Ao mesmo tempo, em um cenário de crise causada por uma dependência energética entre os países, cria-se um cenário de oportunidade para que outras nações possam se mobilizar internamente para ampliar a geração de energia e se destacar ainda mais no cenário global. Oportunidade também para o Brasil, visto que o país possui uma matriz energética diferenciada em relação à matriz mundial, mesmo que ainda distante de um quadro ideal – sendo 44,8% derivadas de fontes renováveis, com destaque para lenha e carvão vegetal, hidráulica e cana-de-açúcar (etanol), além de ser um país pioneiro na produção de biocombustíveis.

 

Nesse sentido, o desenvolvimento do setor energético no Brasil pode ser ampliado com base na produção de energia limpa e maior participação de fontes como biomassa, eólica, solar e hidrogênio verde, elevando o país, a sua produção industrial e o comércio a outro patamar no cenário global. Em virtude desse potencial em liderar um movimento de transição energética, inclusive como exportador de energia limpa, é necessário que o país favoreça o desenvolvimento de políticas comprometidas com a redução e neutralização de emissões e alinhe expectativas junto ao setor privado para implementar ações nessa direção.

 

Um passo importante para viabilizar esse processo foi anunciado pelo BNDS com o programa “net zero”, onde o banco de desenvolvimento assumiu o compromisso de se tornar neutro em carbono até 2050, prometendo atuar no engajamento e aceleração da transição de clientes e empresas parceiras para atingir a meta de neutralidade em carbono. O setor energético é uma das áreas prioritárias do plano que prevê a contabilização das emissões, concessão de crédito e apoio para o desenvolvimento de projetos com base em energia renovável.

 

Durante participação oficial do governo brasileiro na COP27, representada pelos Ministérios de Minas e Energia e do Meio Ambiente, houve expectativa para captação de recursos e investimentos público/privado para o processo de adaptação do setor energético. Além disso, ocorreram debates sobre as estratégias a serem adotadas para ampliar as fontes de baixo carbono, a fim de colaborar com os compromissos assumidos para a NDC brasileira - Contribuição Nacionalmente Determinada para países signatários do Acordo de Paris. Com intuito de impulsionar os investimentos em fontes de energia ainda pouco exploradas como eólica offshore e hidrogênio, Marina Rossi, diretora da Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Energético (SPE), destacou o empenho do governo em acelerar a desburocratização, aumentar a previsibilidade e a segurança jurídica para promover a expansão do setor.

 

A partir dos desdobramentos da discussão energética, outro ponto abordado no encontro foi a questão do mercado global de carbono. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) no seminário “Energia, Indústria, Agro e Investimentos Verdes” enfatizou a importância de um projeto de redução de emissões ou aumento de captura de gases de efeito estufa (GEE) para gerar créditos com fins comerciais, porém, ressaltando ainda a necessidade de aperfeiçoamento dos aspectos legais e regulatórios, tanto na esfera nacional como internacional.

 

Com base numa abordagem colaborativa, essa estratégia serviria para auxiliar empresas e governos no processo de neutralização de carbono, promovendo a troca/venda de redução e remoções entre atores, constituindo e integrando um mercado de carbono global. Contudo, deve-se destacar uma ação de corresponsabilidade junto as empresas para que desenvolvam estratégias internamente para reduzir as emissões das suas atividades, atuando sobre uma perspectiva de prevenção, e não de reparação de danos por meio da compra de créditos de carbono, a menos que a redução das emissões não seja tecnicamente possível de ser empreendida pela empresa.

 

Ainda acerca da participação do Brasil na COP27, destacou-se também a fala extraoficial do futuro presidente, e possíveis apontamentos para o próximo governo com foco na questão do desmatamento zero – política sem licença para o desmate, diferentemente de uma proposta de desmatamento ilegal zero. O desmatamento é uma das principais causas das taxas de emissões no Brasil. Por isso, a declaração logo favoreceu a retomada de investimentos da Alemanha e Noruega no Fundo Amazônia, a fim de garantir as medidas protetivas da maior floresta tropical do mundo, que apesar de estar situada no território brasileiro, sua preservação e/ou desmate, impactam o ecossistema de maneira muito mais abrangente e para além do território nacional.

 

A fala também foi contundente quanto ao cumprimento dos acordos firmados em outras edições da conferência no combate ao aquecimento global, tendo em vista que alguns países originam as maiores emissões de GEE, mas em contrapartida acabam sendo os menos afetados pelos efeitos das mudanças climáticas que resultam em secas, inundações e ondas de calor extremo. Estas, por sua vez, atingem de maneira desproporcional a população de países economicamente mais vulneráveis, logo, o combate à pobreza e desigualdade social são pautas transversais às das mudanças climáticas.

 

Nesse contexto, pode-se dizer que o principal avanço na COP27 se refere à criação do fundo de “perdas e danos”, relativo aos recursos destinados aos países emergentes para executar ações no enfrentamento aos problemas causados pelas mudanças climáticas. A decisão da criação do fundo evoluiu, mas os países comprometidos em financiá-lo não foi estabelecido, ainda que a contribuição seja esperada dos países ricos. Mas o vice-presidente da Comissão Europeia acredita que os países em desenvolvimento, a exemplo da China e Índia, também possam colaborar com o fundo, atentando para o fato de que esses países também são grandes emissores de GEE.

 

De um modo geral, os representantes dos países, empresários e investidores se apresentam na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, supostamente, para contribuir com soluções emergenciais para conter o aquecimento global. No entanto, é notório que os interesses particulares à determinados países e setores, muitas vezes, se sobreponham à questão central do encontro, representando uma desaceleração ao progresso dos acordos e à adoção de estratégias para o bem comum das pessoas e do planeta.

 

Imagens: Nicolae no Pexels.

 

Fontes:


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