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Regulamentação para Economia Circular

Em um cenário de mudanças climáticas, perda de biodiversidade, esgotamento de recursos e desigualdade social, pontos críticos de uma economia global baseada no consumo de recursos limitados, a prática do conceito regenerativo de economia circular se tornou fundamental no processo de enfrentamento de um dos maiores desafios globais da atualidade. Consequência do modelo linear de produção e consumo, esse desequilíbrio socioambiental acendeu o alerta entre entidades de vários países sobre a necessidade de se adotar diretrizes para implementar um padrão de circularidade nas organizações.

Ainda que a economia circular, em grande medida, ofereça resultados a longo prazo, pouco a pouco as organizações têm se atentado para a necessidade de adaptar os negócios à “nova” realidade do planeta. Entretanto, a transição circular costuma ser iniciada com ações pontuais que, eventualmente, já dispõem de padrões e diretrizes específicas, como no caso da reciclagem. Mas para agregar outras ações que impulsionem um comércio global mais sustentável, é necessário expandir as ações em torno de todo o modelo de negócio para que as práticas possam ser reformuladas e padronizadas com base em normas internacionalmente aceitas.

Em razão disso, a sistematização de normas sobre economia circular está em vias de se tornar realidade. Em 2018, uma proposta da AFNOR (Associação Francesa de Normalização) foi aceita pela ISO (Organização Internacional de Padronização) para criar um comitê técnico para formular as diretrizes e a construção de um pacote de padrões comuns para a economia circular. A formulação tem como base norteadora a própria definição de economia circular concebida pela ISO como um “sistema econômico que usa uma abordagem sistêmica para manter um fluxo circular de recursos regenerando, retendo ou agregando valor, ao mesmo tempo em que contribui para o desenvolvimento sustentável”.

Atualmente, esse comitê é formado por 75 membros/participantes de diversos países, incluindo o Brasil (representado pela ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas), além de 21 membros observadores. Prevista para ser publicada a partir de março de 2023, a norma internacional ISO/TC 323 (Economia Circular), reconhecida pela OMC (Organização Mundial do Comércio), tem por objetivo orientar governos, indústrias e empresas de diversos setores no processo de implementação, avaliação e mensuração da circularidade nas organizações.

Os grupos de trabalho que compõem o comitê técnico para elaboração da norma ISO/TC 323 estão estruturados a partir dos seguintes eixos-temáticos:

  • Terminologia, princípios, estruturas e padrão de sistema de gestão (WG1);
  • Abordagens práticas para desenvolver e implementar a Economia Circular (WG2);
  • Medindo e avaliando a circularidade (WG3);
  • Economia Circular na prática: feedback da experiência (WG4);
  • Dados de circularidade do produto (WG5).

 Essa construção também está sendo auxiliada por padrões já existentes, ou seja, a partir de diretrizes que integram o conceito de economia circular, como por exemplo: ISO/TC 207 Gestão ambiental, ISO/TC 207/SC 5 Avaliação do ciclo de vida, ISO/TC 207/SC 3 Rotulagem ambiental, ISO/TC 301 Gerenciamento e economia de energia, entre outras normas.

Para implementação setorial, a integração com diferentes normas estabelecidas continua sendo fundamental. Como contribuição para circularidade na moda, a norma ISO/TC 38 aplicada aos têxteis poderá ser adequada a novos padrões nas seguintes determinações:

  1. Fibras, linhas, fios, cordas, tecidos e outros materiais têxteis fabricados e os métodos de teste, terminologia e definições relacionadas;
  2. Matérias-primas da indústria têxtil, auxiliares e produtos químicos necessários para processamento e teste;
  3. Especificações de produtos têxteis;
  4. Microplásticos de origem têxtil e os métodos de ensaio, especificações, terminologia e definições relacionadas com os mesmos;
  5. Rastreabilidade e fornecimento responsável de fibras animais na cadeia de fornecimento têxtil e os métodos de teste, especificações, terminologia e definições relacionadas;
  6. Questões éticas e ambientais na cadeia de fornecimento têxtil e os métodos de ensaio, especificações, terminologia e definições relacionadas.

A criação de padrões orientados pelo pensamento de ciclo de vida contribui no processo de aceleração da transição do modelo linear para um modelo circular de produção e consumo, pois a norma opera como instrumento de validação dessas práticas. Ademais, quatro padrões que compreendem a norma ISO TC 323, apresentam contribuições para atingir 16 ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU: 1) Erradicação da pobreza; 2) Fome zero e agricultura sustentável; 3) Saúde e bem-estar; 4) Educação de qualidade; 5) Igualdade de gênero; 6) Água potável e saneamento; 7) Energia limpa e acessível; 8) Trabalho decente e crescimento econômico; 9) Indústria, inovação e infraestrutura; 10) Redução das desigualdades; 11) Cidades e comunidades sustentáveis; 12) Consumo e produção responsáveis; 13) Ação contra a mudança global do clima; 14) Vida na água; 15) Vida terrestre; 16) Paz, justiça e instituições eficazes.

A instauração de padrões operacionais ISO também pode auxiliar governos na formulação de leis que atuem sobre os impactos socioambientais desses sistemas, a fim de regulamentar e/ou tornar obrigatória determinadas condutas e usos. Em primeiro momento, as normas e a própria regulamentação podem ser vistas como obstáculos para as organizações devido às dificuldades iniciais do processo de adaptação, sobretudo do ponto de vista econômico, mas também surgem como ferramentas para implementar soluções, melhorar eficiência dos recursos e processos, além de potencializar a credibilidade das operações da empresa no mercado.

Oportunizando uma rampa de maturidade empresarial, se adequar aos padrões de normalização pode ser encarado como uma oportunidade para impulsionar os negócios e alcançar mercados cada vez mais exigentes, que, por sua vez, possuem determinações específicas como critério básico para estabelecer relações comerciais entre empresas engajadas e comprometidas com o desenvolvimento sustentável.

 

Imagens: Sergio Souza no Pexels.

 

Fontes:

 


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