A COVID-19 expôs uma fraqueza fundamental no sistema de moda tradicional: combinar oferta e demanda.

Design e a produção são tipicamente um processo longo e complicado, às vezes exigindo quase um ano para planejar e mover produtos para o mercado. Criamos o costume de fabricar itens sazonalmente sem nenhum feedback prévio dos clientes e, meses depois, esperar que esses itens fossem vendidos em lojas, mas isso não estava funcionando. A superprodução da indústria garante que 30 a 40% do que é produzido, seja direcionado para liquidações contabilizando desperdícios gritantes e caros. A indústria, que já estava em alerta máximo, agora está em alerta vermelho.

Entendida como um "cisne negro"(*), a pandemia mostrou que mudanças rápidas são possíveis e fundamentais para a sobrevivência dos negócios em geral. Na moda não foi diferente pois, de alguma forma, as empresas sob grande pressão, tiveram que se adaptar rapidamente e adotar um novo modelo operacional, sendo que muitas conseguiram implantar em poucas semanas, mudanças que talvez levassem anos para serem adotadas. Não muito distante, também ocorreram algumas alterações no comportamento do consumidor (leia: ). Embora a indústria da moda ainda vá enfrentar um mercado recessivo e precise se acostumar com a incerteza, o momento atual oferece uma chance de redefinir e remodelar processos e intensificar os esforços de forma a se prevenir em relação ao futuro, já que o potencial de novos surtos e bloqueios ainda não estão descartados.

(*) O cisne negro é um animal considerado inexistente até ser visto, pela primeira vez na Austrália, no século XVII. Um Cisne Negro é um evento com três características altamente improváveis: é imprevisível, ocasiona resultados impactantes e, após sua ocorrência, criamos um meio de torná-lo menos aleatório e mais explicável.

As cadeias de suprimentos da moda ainda estão sendo reorganizadas, uma vez que indústrias e fornecedores de têxteis, aviamentos e afins também estão reiniciando suas operações com capacidades reduzidas devido as questões de segurança, tornando o reabastecimento e a logística de distribuição, ainda muito lentos.  Para seguir em frente, é preciso ter total flexibilidade para experimentar coisas novas tornando-se imprescindível tomar decisões urgentes e desenvolver um mapa detalhado para a fase de reinício.

Em meio a tudo isso, a pandemia mostrou que mudanças rápidas são possíveis e fundamentais para a sobrevivência dos negócios.  Voltar a falar em projeto de coleções hoje em dia, é ir além trabalhar de forma mais ágil e assertiva; requer implementar um ‘estado’ de resiliência em todas as etapas do processo, ou seja, criar e produzir coleções mais enxutas com total foco na demanda, capazes de responder com custos competitivos às nuances do mercado de acordo com diferentes cenários quer sejam críticos ou favoráveis.

Criando sua Torre de Controle

Em logística, uma torre de controle é uma alternativa eficiente para o monitoramento de todos os processos que envolvem uma tarefa, no caso, o desenvolvimento de produtos de coleção. Com essa visão do “alto” toda a equipe consegue visualizar melhor as deficiências nos processos como: inconsistência das informações da demanda, especificações de produtos inadequadas, falhas de comunicação nos processos, recursos mal alocados, desorganização, ou seja, tudo o que implica em perda de tempo e dinheiro, e não agrega valor para o consumidor ao longo de todo o processo além de ajustar a velocidade de aceleração para evitar a geração de novos estoques de produtos acabados.

Acionando a “Torre de Controle”: detectar todos os sinais de ponta a ponta.

Para implantar uma torre de controle é necessário um trabalho colaborativo com a participação de toda a equipe que participa das etapas estratégicas ao longo de uma coleção: gestores, designers, estilistas, modelistas, PCP, responsáveis pela produção (em alguns casos, costureiras), marketing, e em alguns estágios, representantes e/ou gerentes e vendedoras. Entendidas as responsabilidades, as etapas devem ocorrer de forma contínua e simultânea, com prazos determinados para checagem e eventuais correções. Lembre-se que assim como a torre de controle dos aeroportos, se houver falhas, a chance de ocorrer um desastre aumenta exponencialmente. Abaixo, alguns pontos a serem observados:

1. Compreensão da demanda atual (dados, dados e mais dados)

Exemplos: Desenvolver relacionamentos com seus principais clientes (inclusive no nível emocional); entender o estado da demanda atual; re-segmentar a base de clientes e quais suas preferências de canal pós-pandemia.

2. Mapeamento dos Processos (você não pode gerenciar aquilo que não pode ver.)
3. Identificação dos desperdícios nas atividades (falta de informação entre atividades/retrabalho, atrasos, estoques intermediários, recursos humanos, materiais e etc.)

Reflexão: Em média, estima-se que cerca  de 30% a 50% a mais de peças piloto são produzidas em relação às que são aprovadas. Não há registros ou controle do número de modelos entregues. Existe uma política clara sobre quantos modelos adicionais deveriam ser gerados? Quais são as vantagens e desvantagens de se desenvolver muitos itens para depois descartar?

Central de Monitoramento

A Torre de controle de sua empresa, deve gerar dados que facilitem o monitoramento e a tomada de decisões nas etapas do desenvolvimento de coleções. Tais dados precisam ser trabalhados de forma ágil para possibilitar a realização de um plano de prioridades e melhorias e de acordo com os resultados encontrados. Com base nos princípios do Lean Manufacturing adaptados ao Lean Design, as demandas e expectativas do cliente devem “puxar” as atividades da empresa, desde o projeto de produto até o suporte pós-venda e logística reversa, evitando paradas e acúmulo de produtos intermediários nas prateleiras. Pontos fortes do monitoramento:1.   Gestão de dados e planejamento da demanda (e do mix de produtos) 2.  Organização interna 3. Flexibilização da cadeia (plano B)4. Identificação de ciclos mais enxutos e alinhados com a demanda.

Continua em: "Coleções Resilientes: Criação Enxuta e Próxima à Demanda (parte 3/3)