Moda e natureza por uma revolução
O Projeto Moda Circular, uma parceria entre o SENAI CETIQT e a Laudes Foundation, promoveu a live Moda e natureza por uma revolução, mediada pelo consultor Bernardo Barbosa e apresentou um pouco do ativismo do movimento Fashion Revolution.
O movimento Fashion Revolution ¹ propõe uma revolução na forma de consumir com o slogan: “quem produz as minhas roupas?” Seu objetivo é proporcionar a reflexão sobre aspectos importantes da cadeia de produção de moda como, por exemplo, as condições de trabalho. O movimento já se espalhou para vários lugares do mundo. Foi lançado após o desastre que ocorreu em 2013, em Bangladesh, quando o prédio de confecções Rana Plaza desabou matando centenas de trabalhadores do setor. O desastre representou um divisor de águas no mercado da moda. A partir daí o Fashion Revolution e outras iniciativas ajudaram a ecoar os reais problemas do setor, fortalecendo um movimento de transformação.
Convidamos para a conversa a Fernanda Simon, diretora executiva do instituto Fashion Revolution Brasil, ativista e editora contribuinte de sustentabilidade da Vogue Brasil. Fernanda estudou moda na Faculdade Santa Marcelina e iniciou sua carreira com moda e sustentabilidade na Inglaterra, há mais de 12 anos. Foi responsável por trazer o movimento global Fashion Revolution para o Brasil e iniciar as articulações no país. Fundou o Instituto Fashion Revolution Brasil em 2018. Durante anos vem liderando e participando de projetos, campanhas e ações por uma moda que faça o bem para as pessoas e para o planeta, fortalecendo o conceito de moda como ferramenta de transformação.
Além de: “quem produz as minhas roupas?” outras perguntas começam a emergir no movimento como: “de que são feitas as minhas roupas?” Os questionamentos feitos pelo Fashion Revolution trazem à tona os impactos que o setor da moda em diferentes abordagens como social, ambiental e cultural. Entre as várias correntes ativistas que o Fashion Revolution atua a proposta do evento foi apresentar a relação da moda com a natureza, onde a moda assume um papel fundamental facilitador da transformação da sociedade e regeneração do planeta.
No dia da live Fernanda estava em uma ação importante na Amazônia. Estava no Acre, a convite da ONG SOS Amazônia, para conhecer e acompanhar de perto o projeto “Faça florescer floresta” desenvolvido pela organização. O projeto foi iniciado em 2019 e incentiva a restauração da floresta Amazônica através da cobertura do solo. Busca atingir esse objetivo apoiando produtores locais com a implantação de sistemas agroflorestais, promovendo a conscientização contra o desmatamento, a conservação de áreas de nascentes, além da geração de renda para as comunidades amazônicas. Todos esses benefícios através da recuperação de terras degradadas em pequenas propriedades ². O projeto vai de encontro ao trabalho de agricultura regenerativa desenvolvido pela Farfarm que já foi apresentado em live e postagem do projeto Moda Circular.
Fernanda destaca a crise de degradação ambiental que estamos assistindo e a urgência por ações que ajudem na reversão desta crise. Segundo ela: “a emergência climática é uma realidade e temos pouco tempo para reverter essa situação ou então a humanidade deixará de existir. O planeta irá se regenerar, mas a humanidade não sobreviverá.” O assunto precisa ser prioridade de todos e exige ações efetivas de vários setores. O setor da moda relaciona-se à questão da degradação ambiental sob vários aspectos. Fernanda ressalta que as marcas, confecções e indústrias precisam ficar atentas à origem das matérias-primas: “de que são feitas as minhas roupas?”. A ferramenta mais eficaz para conhecer essas origens é através da rastreabilidade.
Fernanda destaca o índice de transparência, uma ação importante desenvolvida pelo Fashion Revolution. A ferramenta analisa as maiores marcas que operam no Brasil no setor da moda, avaliando os impactos negativos e positivos que essas marcas causam. O índice não apenas demonstra a realidade da cadeia produtiva do setor, mas também promove a conexão e o engajamento dessas marcas que buscam melhorar suas práticas. Segundo Fernanda a transparência não é sinônimo de sustentabilidade, mas representa um caminho na construção desta trilha. O caminho precisa ser construído através do tripé ambiental, social e cultural e a biodiversidade da Amazônia tem muito a contribuir nessa conexão entre natureza e moda favorecendo um movimento de transformação.
Sob a perspectiva ambiental uma das soluções, como já apresentado, é a restauração da floresta através do agroflorestamento que pode ser feito com o plantio de fibras naturais para a tecelagem, como o exemplo da Farfarm. Fernanda destaca a fibra da palmeira Tucum que era tradicionalmente usada pelos povos indígenas e, apesar do enorme potencial, hoje é pouco utilizada. Ela revela ainda o importante exemplo e símbolo de sustentabilidade que hoje a borracha representa na região. O extrativismo do látex acontece em áreas preservadas, a atividade representa prosperidade, sendo praticada por comunidades locais, resgatando a cultura local, preservando a floresta e ainda gerando desenvolvimento econômico e social.
Na década de 1980 os seringueiros se movimentavam lutando pelo fim da devastação da floresta e o direito pela posse de propriedades onde pudessem extrair o látex de forma sustentável. A associação SOS Amazônia foi criada neste período com o objetivo de defender a causa extrativista e a proteção da Floresta promovendo a população local.
Fernanda conclui citando a marca de tênis franco-brasileira Veja, no Brasil conhecida como Vert, que ela classifica como um exemplo de sucesso. Os desafios são enormes, mas os casos de sucesso existem. Seguindo o propósito da sustentabilidade a produção de tênis da marca respeita o ritmo de sua cadeia produtiva. O látex é extraído em cooperativas de seringueiros na Amazônia e o algodão agroecológico cultivado no Ceará. A matéria prima é negociada diretamente com as cooperativas sem intermediários.
Sob a perspectiva social e cultural a convidada destaca a importância de valorizarmos os saberes ancestrais dos povos indígenas que vivem completamente conectados à natureza. Eles têm muito a nos ensinar e precisam ser ouvidos, respeitados e valorizados. Mas infelizmente isso não tem acontecido. Segundo Fernanda a realidade é que os povos indígenas vivem em condições de vulnerabilidade social. O Brasil precisa de políticas públicas eficazes para protegê-los.
Respeitar e ouvir os povos indígenas, além de entender e conhecer seus hábitos e costumes é fundamental para alcançarmos a almejada conexão com a natureza e dessa forma reverter a degradação ambiental que estamos vivendo, fortalecendo um movimento de transformação. Fernanda finaliza a conversa indicando a leitura da ecofeminista e ativista ambiental indiana Vandana Shiva. Segundo Fernanda a autora, a partir de sua perspectiva ecofeminista, traz questões urgentes de gênero e raça, questões de inclusão e respeito aos direitos humanos, que precisam ser refletidas e debatidas. Fernanda conclui que a diversidade da natureza humana é infinita assim como a diversidade física da natureza e precisam ser valorizadas como ferramenta de transformação. O Fashion Revolution apresentado na live promovida pelo SENAI CETIQT representa um movimento fundamental fortalecendo a construção de uma moda nacional mais circular. Você poderá assistir essa live na íntegra aqui.
Imagens: Olha Ruskykh no Pexels;
Saiba Mais:
² Projeto Faça Florescer Floresta;