O “CLIMA” DA MODA PARA OS PRÓXIMOS DEZ ANOS
As mudanças climáticas e o rápido aquecimento do planeta experimentado nos últimos anos tornaram-se pautas urgentes. A Cúpula de Lideranças sobre o Clima, que aconteceu nos dias 22 e 23 desse mês, reuniu, virtualmente, líderes de 40 países para discutir ações de enfrentamento à crise global frente às mudanças climáticas. O encontro, em torno do tema “Como podemos mover-nos rapidamente para limitar o aumento da temperatura?”, teve o papel estratégico de estimular a criação de planos para reduzir as emissões de gás carbônico e de outros poluentes até 2030, e alcançar a neutralidade nas emissões até 2050. A meta norteadora, ou melhor o grande desafio, é o de manter os níveis de aquecimento da Terra no limite de 1,5°C. A reunião antecipou as discussões que acontecerão na COP26 (Conferência das
Nações Unidas sobre Mudança Climática), que será realizada em novembro deste ano, na Escócia. Na ocasião, os líderes das diferentes nações apresentarão os compromissos firmados em 2015, no Acordo de Paris, reformulados e com metas mais concretas para a redução de emissões.
O primeiro dia da Cúpula coincidiu com a data em que se comemora, internacionalmente, o Earth Day (Dia da Terra), criado nos anos de 1970 com o objetivo de estimular uma consciência comum em torno das preocupações ambientais para proteger o planeta. O tema escolhido para esse ano foi a “Restauração da Terra”. Mesmo depois de mais de 50 anos, ainda se discute os mesmos problemas – contaminação, a importância da conservação da biodiversidade, a camada de ozônio, o aquecimento global –, com a diferença de que agora, todos eles, atingiram proporções extremas, e, seguem ao lado de outros, como as ondas de calor, as queimadas e as inundações. Clichê à parte, a máxima de que problemas extremos, exigem medidas extremas nunca fez tanto sentido como agora. Esta década é considerada crucial. As ações tomadas nesse período serão de extrema importância para determinar o futuro próximo.
O mote do encontro foi sobre as oportunidades que a abordagem da mudança climática oferece. A partir dessa perspectiva, investir em inovação e tecnologia, e também produzir energia limpa tornam-se prementes para “construir uma economia que não seja apenas mais próspera, mas mais saudável, mais justa e mais limpa para todo o planeta” (discurso da sessão de abertura da Cúpula do Clima). Certamente, surgirão oportunidades que ainda nem foram concebidas.
Mas, o que tudo isso significa para a Moda?
Um dos pontos mais abordados na Cúpula do Clima foi a definição de metas de redução das emissões de CO2. A indústria da moda, responsável pelo fluxo de grandes volumes, tem um papel fundamental no desenvolvimento de estratégias para mitigar o impacto da sua produção sobre o meio ambiente. Em 2018, segundo dados do relatório Fios da Moda da Modefica, em todo o mundo, o setor emitiu 2,1 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa, o que corresponde a 4% das emissões globais. Diante disso, mudar o sistema de produção da indústria da moda não é mais uma questão de escolha. O chamado é urgente.
Produzir em conformidade com a emergência climática exige pensar no produto de forma holística, com a constante avaliação das implicações relacionadas a cada decisão de projeto, considerando todo o ciclo de vida do produto, o que inclui a produção da matéria-prima, o desenvolvimento, o uso e o descarte. Isso é fundamental para compreender que cada fase desse sistema está vinculada a todas as outras, e, que para alcançar resultados contínuos em direção a redução das emissões, as ações precisam ser articuladas em conjunto.
Essa abordagem sistêmica é o que propõe a economia circular. Seu conceito, amplia a cadeia de valor para abranger todo o ciclo de vida do produto, do início ao fim. Com base em cinco princípios: projetar resíduos; resiliência através da diversidade; uso de energia renovável; pensamento em sistemas; e resíduo como nutriente, a economia circular descreve um cenário onde a vida do produto se estende através de reparação, reforma e remanufatura. A aplicação desses fundamentos tem como principais efeitos a redução no uso de recursos virgens, e, consequentemente, na geração de resíduos.
Nesse sentido, o “clima” da moda para a próxima década deve ser o de projetar peças para uma existência prolongada, com base na eficácia dos recursos, no reprocessamento e na reusabilidade. Os tecidos e os aviamentos precisam ser adquiridos e produzidos dando preferência aos recursos locais, com materiais biodegradáveis e/ou recicláveis. Quando for o caso, é importante prolongar ao máximo o uso das peças, mantidas por meio de cuidados e boas manutenções. Outra solução é o projeto de produtos que podem ser compartilhados com vários usuários ao longo da vida útil. As peças também podem ser projetadas para ter diferentes usos, e, no fim, possibilitar a reciclagem e reuso dos materiais e componentes para a produção de outro item novo. Por fim, se a matéria-prima utilizada for inadequada para a reciclagem, o material precisa ser compostado para se tornar nutriente para as plantas e outros organismos vivos do ecossistema.
Todas, e cada uma das ações sugeridas, refletem na redução da pegada de carbono provocada pela indústria da moda. Entretanto, essa nova perspectiva não deve ser julgada como um prejuízo, pelo contrário. Os discursos apresentados na reunião da Cúpula do Clima chamaram atenção para as oportunidades de negócios que vão surgir como resultado dos novos modelos de produção.
Há diversas maneiras de contribuir para a mudança. O importante é despertar para a responsabilidade quanto ao futuro do planeta e passar da intenção para a prática, de preferência de forma coletiva e organizada, pois desse modo, os resultados serão mais visíveis, efetivos e duradouros. É considerável entender onde se localizam cada um dos atores que fazem parte do processo em torno dessa questão, para que seja possível apresentar planos de ação mais efetivos. O momento para atuar é hoje! A realidade é inegável. Um futuro mais sustentável, próspero e seguro, de saúde e bem-estar, dependem do agora.
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